Cova
da Onça – Um diamante que não precisa ser lapidado.
No
dia 03/07/2014, participei de uma Audiência Pública que durou 08 (oito) horas,
um dos eventos mais incríveis que já tive a oportunidade de assistir. Foi uma
audiência para apresentação à comunidade do Projeto Turístico -Imobiliário
Fazenda Ponta dos Castelhanos – um mega projeto imobiliário que prevê a
ocupação de 20% (16.507.752,11 m²) de toda a área da ilha de
Boipeba/Cairú/Bahia/Brasil – local de natureza exuberante ainda preservada;
integrada por uma APA; cercada em quase toda a sua totalidade de manguezais,
apicuns, restingas e Mata Atlântica; utilizada por uma comunidade de pescadores
e marisqueiras e extrativista conhecida como Cova de Onça (São Sebastião) em
sua subsistência; cercada ainda pelas comunidades da Velha Boipeba, São
Francisco e Moreré; com influência sobre comunidade quilombola e de Barra dos
Carvalhos.
A
audiência aconteceu em Cova de Onça – comunidade composta por aproximadamente
760 pessoas, em quase sua totalidade de pescadores, marisqueiras e
extrativistas; formada por um povo muito especial e diferenciado, com uma
identidade coletiva ímpar, que o destaca da sociedade como um todo de maneira
tal que, a cada vez que retorno de lá, sinto que saí melhor, mais forte, mais
rica em espírito, em esperança na humanidade, em crença na cidadania. No último
dia 03, tive vontade de não mais sair dali.
Diante
de um projeto de padrões milionários ofertando à esta comunidade todas as
vantagens estereotipadas do mundo capitalista, aquela população, surpreendendo
a todos os presentes, teve a lucidez e sabedoria de dizer não em proteção do
seu modo de vida, dos seus princípios, das suas crenças, numa demonstração da
envergadura moral que eu sempre vi neles, mas que ficamos com medo de acreditar
que seria capaz de fazer resistência ao poder econômico. Eles foram brilhantes!
Eu não tenho como dizer em palavras o que vi. Aos presentes pareceu um momento
encantado – um povo vendo com olhos de tribo os equívocos apresentados e
gritando de todas as formas, com falas que vinham do mais profundo de suas
almas pedindo proteção, parecendo-nos que cada um deles tinha a alma do Cacique
Seattle da tribo Suquamish retratada na carta de 1855 ao presidente dos EUA.
Não
foi pouco o que se assistiu, de modo que é impossível não voltar com o
compromisso de buscar reforços àquele grito de socorro, porque sei que, a
partir daquele momento, a paz deles estará fortemente comprometida pelas
pressões que sofrerão do poder econômico e dos interesses políticos. O fato é
que o projeto como está confina e condena à extinção a comunidade de Cova da
Onça, ela percebeu isso e entendeu o relatório do projeto – apresentado por uma
enorme equipe de técnicos e colorido de promessas de empregos e riquezas -,
como algo ruim, indesejável, inviável e agressor.
E,
para se proteger, com os seus conhecimentos transmitidos de pais para filhos e
pela experiência, sem nenhum conhecimento de legislação ambiental, deixando
qualquer engenheiro ambiental abismado, revelando a sua sabedoria ancestral,
apontou inúmeros equívocos graves do projeto relacionados a agressões ao meio
ambiente e às consequências sobre a pesca, a mariscagem, o extrativismo, o mar,
cardumes, redes, embarcações, etc. Ficaram até o final, sem almoçar, sem sair
do ambiente da audiência para nada, ouvindo os mínimos detalhes e rebatendo às
justificativas apresentadas por uma equipe técnica de mais de 30 técnicos
contratados pelo empreendedor para elaborar o projeto. Ao final, muitas
questões sem respostas ou com respostas insatisfatórias, um projeto cheio de
pontos sem clareza dando margem a todo tipo de ajuste na fase de implementação,
sem preservação das áreas de apicuns, prevendo corte de área de mangue de 100
metros, loteando e cercando manguezais e áreas indispensáveis à sobrevivência
da comunidade, sem delimitação dos caminhos de circulação da população há
séculos, sem solução para o acréscimo do incremento de quase 260% de lixo e
para os diversos impactos ambientais que ele mesmo aponta, prevendo um mínimo
de 152 lanchas circulando por áreas de mergulho dos pescadores e danosas à
pesca, três piers, imensa área de campo de golf, gerando na grande maioria uma
insegurança enorme no que se refere às garantias de preservação e prevenção de
impactos ao meio ambiente.
Fora
dito naquela oportunidade que a ilha de Boipeba foi eleita a terceira mais
linda do mundo, estamos falando de Mata Atlântica, manguezais, fauna e flora
que a todos pertencem, e de uma das APAs (Área de Proteção Ambiental) mais
importantes do país. Toda essa riqueza não só pertence ao pescadores e
marisqueiras de Cova da Onça e São Francisco, ao povo de Moreré, Velha Boipeba
e Barra de Carvalho, mas a toda à humanidade. Por isso, esse texto pretende
informar à maior quantidade de pessoas possíveis o que está acontecendo para
que juntos possamos garantir que nenhuma etapa e estudo seja atropelada(o) e/ou
desvirtuada(o) no Procedimento de Licença Prévia do referido projeto em trâmite
no INEMA/Bahia, em Processo sob o nº 2001-015414/TEC/LL/0046.
Aos
meus anjos, guias e protetores, eu peço que ajude na conscientização do
empreendedor para que, ao contrário de travar com estas comunidades e com a
natureza uma luta desproporcional e prejudicial a todos, reescreva o projeto e
redirecione o seu público alvo consumidor buscando pessoas que possam pagar um
preço de um bem valorizado pela preservação da humanidade, cultura e da
natureza exuberante que há ali. Se assim não for, Estado APAREÇA!
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