Liderados pelo ex-Campeão
Brasileiro de Longboard Bernardo Mussi, surfistas de Salvador apresentaram,
nesta semana, o resultado do movimento Fundo da Folia que faz a limpeza das
praias da Barra após o Carnaval.
Fotos: Fundo da Folia
Mais uma vez, o resultado do
mergulho, após o carnaval, foi surpreendente. Foi retirado de lixo hospitalar
até uma churrasqueira. O que não surpreendeu foi constatar que após tantas
ações, tantas denúncias e diversas intervenções pouco incisivas do poder
público, a situação vem se agravando.
É decepcionante concluir que
não há sinais de conscientização, melhora na educação e nem o aumento do
interesse da nossa gente pela conservação dos patrimônios ambientais,
históricos e culturais desta cidade.
A percepção dos curiosos que
passavam no local foi a mesma. Com indignação, baianos e turistas fizeram
fotos, filmaram e nos parabenizaram pelo esforço. Até um grupo de Japoneses
arregalou os olhos com a sujeira. O guia ficou envergonhado.
Um senhor visivelmente
intrigado, começou a puxar conversa. Explicamos que o Fundo Da Folia é um projeto voluntário, sem vínculos comerciais,
motivado pelo amor à natureza, à cidade e às pessoas que moram aqui. Falamos
que além da conservação ambiental nossa intenção é divulgar, discutir o
problema e propor soluções. O Parque Marinho da Barra é um exemplo.
Ele perguntou sobre
conscientização. Provocamos a reflexão: Se nem o poder público tem se
conscientizado dos danos provocados à cidade pelo agigantamento do Carnaval na
Barra, o que se pode esperar da população? Ele coçou o queixo, e continuamos...
Conscientização rima com
educação. Aliás, nossa terra há muito sofre com a pecha de abrigar um dos povos
mais sem educação do país. Temos fama de barulhentos, mijões, sujões e cegos ao
direito alheio. E nos parece que o poder público incentiva tais comportamentos
em ações equivocadas como tem feito nos últimos carnavais.
Achamos, por exemplo, que o
imoral desatino de fazer propaganda e usar a máquina pública para potencializar
o aumento do consumo de bebidas alcoólicas é uma incoerência. O álcool
prejudica a educação, saúde e segurança. É dever de ofício, e não opção de
governo, adotar políticas contrárias ao seu consumo.
O carnaval da Barra é outra
sandice. Cresceu demais e os danos que provoca já não podem ser desprezados. As
súplicas dos moradores, comerciantes locais e meio ambiente são legítimas! O
circuito do “glamour” não pode mais esconder a tensão entre a força do capital
e a fragilidade dos patrimônios, inclusive humanos, que o mitificam.
Não é a toa que as cores do
intestino deste circuito, mais uma vez, foram o laranja e o preto. Laranja do
capital sem alma e preto de almas sem capital. A banalização deste cenário tem
gerado uma “carnavalização cultural” com efeitos sociais preocupantes.
Nosso interlocutor
interrompeu: “Agora entendo porque Salvador não trata adequadamente seus
patrimônios culturais. O foco descabido em festas atrofia a importância destas
riquezas tornando-as pano de fundo, latrina e lixeira para trá, trá, trás e
lepo, lepos. Vira costume, vira a carnavalização cultural que vai sufocando
outras perspectivas. É o caso da Barra. É o caso do Centro de Convenções, do
hotel Pestana, do turismo de negócios e da Orquestra Sinfônica da Bahia que
seguem agonizando.”
Continuou: “Sobre o álcool,
certo que a propaganda altera o comportamento das pessoas. Tanto que já não há
diversão sem cerveja em Salvador, uma falácia construída pela subserviência do
mercado, meios de comunicação, políticos e governos às cervejarias. Por isso a
prefeitura legitima o aumento do consumo, a densidade dos pontos de venda, a
propaganda sem critério e a venda sem controle. Vai nutrindo um passivo
socialmente perverso. Um dia terá que pagar a conta! ”
E arrematou: “Olhando agora
este lixo submarino começo a enxergar muito além do que ele realmente aparenta.
Tenho a impressão que vocês viraram a festa ao avesso mostrando um lado que
ninguém quer mostrar. Há um conflito entre a Barra, seus patrimônios e o
carnaval que cresceu demais. Vejo ainda cores que nunca tinha visto”.
Fizemos questão de dizer que
não éramos contra o carnaval, a prefeitura nem a cerveja, mas a favor da nossa
cidade. Por isso achamos que o admirável prefeito deve repensar o tipo de
relação que mantém com as cervejarias e ter coragem para propor alterações
profundas no carnaval da Barra diminuído os dias e atrações.
Legal deixar o circuito Sérgio
Bezerra, o Furdunço e o Fuzuê por 3 dias, e criar no CAB, ou em outro local, a Cidade Do Axé para trios e camarotes.
Esta medida protegerá os patrimônios da Barra, diminuirá a vergonhosa incitação
ao trabalho desumano de uma cor só e dará destaque a cada circuito por suas
peculiaridades.
Um Shopping a serviço do
álcool. Desvio de finalidade para sobreviver à carnavalização da Barra. O
Barracenter vira o Alcoolcenter...
Veio a despedida do nosso
amigo: “Vou levar estas ideias ao corajoso prefeito, aos artistas que amam
Salvador e aos empresários que enxergarão ótimos negócios na Cidade Do Axé. Vou à imprensa e ao
Ministério Público pelas questões ambientais, do patrimônio histórico e da
promiscuidade etílica que embriaga nossa cidade!”.
Instigado, fez algumas fotos e
nos parabenizou. Ficou alguns segundos olhando para o mar, para o lixo e para o
Farol, e seguiu andando cabisbaixo...
Logo veio o comentário de um
dos nossos: “Nem para esse cara ser o prefeito, Ivete Sangalo, Ricardo Boechat,
o dono de um camarote ou cervejaria disfarçado de gente normal...” E caímos na
gargalhada.
Diríamos ainda àquele baiano
de alma que a fragilidade megalomaníaca pela busca do “MAIOR” carnaval do
mundo, em meio a tantos sacrifícios por um título de efeitos incipientes, é um
equívoco. Inteligente seria usar de humilde assertividade para produzir o “Melhor” carnaval do planeta com
sustentabilidade e ganhos sociais permanentes. É só colocar o interesse
público, e não do público, como prioridade, e entender que Salvador é bem maior
que o carnaval.
Não parece, mas a luz do Farol
é infinitamente maior que o laranja da folia, e infinitamente melhor para a
cidade. Há quem diga, inclusive, que sem ele o padrão de desenvolvimento desta
cidade seria bem melhor. Será?
Fato é que a folia precisa ser
realmente boa para a cidade. Por isso o Carnavalimpo
no CAB é uma opção contra o Carnavalixo
da Barra. Medida urgente que sinaliza o quanto amamos Salvador. É o que pensa o
Fundo Da Folia...
Para saber mais sobre o
álcool e proteção dos patrimônios
culturais brasileiros:
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